"Faço-lhe notar que um ser humano que não sonha é como um corpo que não transpira: armazena uma porção de toxinas"
Truman Capote

2.25.2007

Do delirante e do imponderável

Muito se tem falado ultimamente da China a propósito das mais diversas questões, quer tenham estas a ver com o comércio, a poluição, o consumo energético e até, porque não dizê-lo, as eloquentes declarações do ministro Manuel Pinho.

O imparável crescimento deste gigantesco país, por entre toda a sorte de desmandos, tem feito acender sinais de alarme em todo o mundo ocidental.

Tendo por horizonte mais próximo a miragem de promissores acordos comerciais, a questão dos “direitos humanos” foi remetida para o recanto menos iluminado do salão onde se discutem as questões essenciais no que diz respeito às chamadas parcerias estratégicas ou oportunidades de negócios entre a China e o Ocidente.

Não fora uma nova e ostensiva incursão do governo chinês neste domínio – o do “direitos humanos” – e tudo navegaria num mar de calmaria, tão longe já vai a “Primavera de Pequim”.

De facto, nas últimas semanas, a China tem sido notícia precisamente porque novas e inquietantes medidas têm vindo a ser tomadas no que às liberdades individuais diz respeito.
A título de exemplo, refira-se a recente edição, por parte do município de Pequim de 1,5 milhões de exemplares (eu repito: um vírgula cinco milhões) de um livro intitulado “Manual Geral de Civilidade e Boas Maneiras”, no qual e ao longo do seu reduzido número de páginas – são só 112 !?! – se trata de uma forma muito peculiar, tudo aquilo que se possa imaginar acerca do que os seus autores conseguiram apurar, sabe-se lá com que critérios, sobre os comportamentos humanos e regras de etiqueta da Europa e da Ásia.
Este precioso livro, tem como propósito declarado lavar (sentido lato e sentido estrito) a imagem da China moderna, aproveitando a montra que é de facto a realização dos Jogos Olímpicos de 2008.

Os desígnios por detrás de tão famigerada edição estão declaradamente explícitos, o que não é dito mas está sem dúvida implícito é uma nova ofensiva contra os mais elementares direitos dos cidadãos, já evidenciada através de medidas avulsas. O município pequinês já andava às voltas há algum tempo com o problema da erradicação de alguns dos salutares hábito que os habitantes da cidade (e pelo menos de grande parte do resto do país ao que sabe) tão carinhosamente cultiva.

Senão vejamos: Os chineses têm vindo a ser exortados no sentido de deixarem de cuspir para o chão e de deitarem o lixo para a rua !!!
Ao que parece, a persuasão não tem sido suficiente e entrou-se assim em velocidade de cruzeiro no domínio da mais inclassificável coacção com a aplicação de multas de 5 euros para quem seja apanhado a praticar tais actos.

Só um país bárbaro e desrespeitador dos mais elementares direitos, pode de tal forma proceder. Felizmente que vivemos em democracia, num estado de direito e num país moderno e civilizado onde tais actos não se praticam e consequentemente, tais medidas de modo algum se justificam.
São de facto hábitos estranhos – a que nós portugueses somos de todo alheios – mas que, em nome da biodiversidade devemos respeitar.

Mas, infelizmente para os chineses, a ofensiva governamental não se ficou por aqui.
Passo pois a citar alguns excertos da mais sublime prosa.
“Ao ir à casa de banho, não se esqueça de puxar o autoclismo e depois lavar as mãos…”

Mas… onde já se viu!

Aquando de um cumprimento “apertar a mão de outra pessoa de forma ligeira e deixar que o aperto dure cerca de três segundos”.

O pior ainda está para vir. É que para além da desumana imposição destas estranhas normas de conduta, cerceadoras das liberdades de cada um, existem outras bem mais delirantes.

“…os habitantes de Pequim devem andar de cabeça levantada, com o torso direito e os ombros relaxados. Os braços devem mover-se naturalmente para a frente e para trás e os pés devem pisar o chão de forma ligeira mas estável”.

Para além de expressar um enorme sentimento de revolta, aquilo que se me oferece dizer é que seria de extrema utilidade acompanhar esta extraordinária edição, com uma grandiosa exposição com as esculturas de Giacometti e os mobiles de Calder.

É que, talvez vendo algumas das obras destes autores os chineses pudessem aprender alguma coisa com esta matéria, que é já toda ela do domínio do delírio e da imponderabilidade.

O que haverá para ver de mais delirante e imponderável do que as peças de um e outro?

2.01.2007

Exposto em Fevereiro

Vai estar presente de 5 de Fevereiro a 5 de Março no “Império dos Sentidos”, Restaurante-Galeria situado na Rua da Atalaia (Bairro Alto) uma nova mostra da série “Não te preocupes, são apenas sonhos povoados de gestos…”, série parcialmente exposta no final de 2006 na "Galeria IF".

Desta feita será exposta a totalidade da série, sendo mostradas conjuntamente as fotografias e intervenções com os desenhos (storyboard) que lhe estiveram na origem.