Embora possa parecer que, a propósito dos Jogos Olímpicos, da China, dos Direitos Humanos, da Liberdade de Expressão e de Politica Ambiental, que já tudo foi dito, não só não o creio como acho precisamente o contrário. Ainda não está tudo dito… nem estará, enquanto valores mais baixos se erguerem.
Estamos a falar de quê?
Não é certamente da deslumbrante cerimónia de abertura que as televisões de todo o mundo reportaram, as rádios ecoaram e os jornais documentaram.
Primeiro que nada, há que dizer que a retórica dos Direitos Humanos está morta e enterrada perante o crescimento económico da China e as oportunidades de negócio à escala global que esse mesmo crescimento propicia. Perante este cenário, dos políticos que governam o mundo e do “realismo” que os caracteriza, nada mais se pode esperar do que genuflexões sucessivas e o pesado silêncio a que as conivências obrigam.
No que à Política Ambiental diz respeito, para o parceiro chinês não existem Protocolos de Quioto ou outros quaisquer valores a cumprir em termos de emissão de gases ou outras poluições menos visíveis. Está tudo no seu devido lugar desde que o mercado continue aberto à penetração das empresas ocidentais.
Será legítimo que um país assim organize os Jogos Olímpicos, jogos esses, que nasceram com um ideal, assente na nobreza de princípios e mais todo um alardear de boas intenções e nobres propósitos que hoje em dia já não se verificam, mas cuja mística ainda se tenta fazer passar por entre as campanhas publicitárias do enorme mercado e conjunto de interesses instalado em seu redor, que fazem viver os jogos (ou antes pelo contrário é para isso mesmo que eles vivem?).
Certamente que sim! Sem dúvida que um mercado desta envergadura é o cenário ideal para montar o circo olímpico (circo no pior sentido do termo entenda-se).
E a liberdade de expressão? O último reduto ocidental… aquele que se movimenta à “revelia” dos poderes instituídos? O inimaginável aconteceu? O “quarto poder” rendeu-se ao capital!?! Não estava ainda rendido? As principais cadeias de televisão, os mais importantes jornais e revistas, não pertencem a grandes grupos económicos? E alguns destes grandes grupos não pertencem ou se cruzam com interesses políticos mais ou menos evidentes? E os profissionais? Os jornalistas?
Demasiadas perguntas para uma só resposta… todos sem excepção se vergaram às vergonhosas condições de trabalho impostas pelas autoridades de Pequim. Liberdade, certamente, mas aquela que os governantes chineses entenderem - e que é a sua - e que está à vista com os resultados que se conhecem.
Um entender muito peculiar dessa liberdade, que levou, por exemplo, à detenção do professor Liu Shaokun, que após o sismo que ocorreu em Sichuan, colocou na Internet imagens de escolas que ruíram. As razões apontadas para a detenção? “Espalhar rumores e destruir a ordem social”. A causa efectiva? A prova evidente da fragilidade das construções que ruíram de forma calamitosa provocando enorme número de mortos.
Estamos a falar de quê?
De uma outra dimensão, onde uma maneira de pensar à escala humana não tem lugar.