Na origem de mais uma provincial polémica esteve a reprodução de uma tela de Gustave Courbet pintada, imagine-se em 1866.
A dita tela teve desde o princípio uma existência atribulada. Foi pintada por encomenda do embaixador turco em França (à época, obviamente). O referido embaixador coleccionava quadros onde a lascívia era presença obrigatória. O quadro de Courbet era parte da colecção e encontrava-se oculto por outra tela e só era mostrado e um círculo íntimo e em ocasiões especiais. Depois do tal embaixador, andou por outras mãos, numa existência que se pautava pela semi-clandestinidade até chegar – por aquisição - à posse do psicanalista Jacques Lacan e por morte deste, doado ao estado francês podendo agora ser visto, sem impedimentos nem constrangimentos no Museu D’Orsay.
“A origem do mundo” tem mais de cem anos de existência e apenas um decénio de exibição pública…
Eis senão quando, aparece exposto – na via pública – em Braga, na capa de um livro, numa feira de saldos. Tanto bastou para que surgisse a controvérsia… almas mais impolutas e puritanas alardearam bem alto o seu incómodo por tão despudorada exposição. Chamada a polícia – zelosa e cumpridora – lá foram os livros apreendidos e a reprodução d”A origem do mundo” arrecadada.
O conteúdo do livro nunca esteve em causa. A razão de ser da celeuma era apenas a capa.
Edificante!
Um pouco atabalhoadamente chegaram as explicações oficiais… os livros foram apreendidos porque se temia uma alteração da ordem pública por parte dos incomodados e ofendidos por tão ignominiosa mostra daquilo que só no recato deve estar… Esta ridícula situação e a caricata atitude despoletada por uma capa de livro, são afinal fruto e produto do mesmo provincianismo que anos antes fizera sair à rua as famigeradas “mães de Bragança” em tonitruante invectivação contra “as brasileiras” dos bares de alterne que lhes desviavam os maridos, sabe-se lá com que artes demoníacas que serão certamente aparentadas com as artes de Courbet…
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