"Faço-lhe notar que um ser humano que não sonha é como um corpo que não transpira: armazena uma porção de toxinas"
Truman Capote

8.02.2009

Tagarelice...


A utilização de transporte públicos tem vantagens inestimáveis. Andar a pé, também, mas fiquemo-nos agora pelas virtualidades dos transportes públicos. As inúmeras vantagens que se extraem da utilização dos ditos, prendem-se com motivos que o senso comum rapidamente apreende e faz seus – com razão, diga-se – como sejam o contributo para a diminuição dos níveis de CO2. Esta razão, só por si devia mobilizar, sem reticências os cidadãos e levá-los a trocar o transporte individual – egoísta, poluidor e entupidor das artérias das cidades – inúmeras vezes abusivo e desnecessário. A praga dos automóveis nas ruas, é mau para quase tudo… para quem circula nos transportes públicos porque dificulta a progressão destes, para quem anda a pé porque (quantas vezes indevidamente estacionados) dificultam ou impedem a circulação, para quem quer admirar, desfrutar ou fotografar a cidade porque o mais das vezes são “ruído” (em sentido lato…) ou poluição (em sentido lato…) visual nas imagens que se captam.

Entretanto perdi-me e já não sei porque é que tudo isto começou!?!

Os transportes públicos, pois… como os cafés-cafés (espécie em extinção, é bom recordá-lo) ou outros lugares públicos são óptimas fontes de inspiração ou recolha de material para escritores e outros observadores. São óptimos locais para ouvir a tagarelice, escutar a opinião pública (porque falham tanto as empresas de sondagens?), para escutar notícias “em primeira mão”, para a bisbilhotice, o diz-que-disse, para fazer propagar boatos e amplificá-los, enfim, também tem destas coisas e temos que saber viver com elas. Assunto recorrente, para além das atribulações do defeso futebolístico, tem sido a gripe A. Não existe quase ninguém que não conheça alguém que a tenha sem contudo perder a dose de desdém e displicência que estas coisas merecem ao cidadão comum descrente em pandemias como nas bonomias do sistema político e dos resultados dos próximos actos eleitorais.

Um dia destes escutei no metro, uma conversa intrigante de três senhoras aconchegadas num daqueles bancos corridos do meio das carruagens. Devo dizer que não me pus à escuta. Simplesmente ouvi porque as senhoras não faziam segredo do seu dizer e eu sentado em frente, não me impedi de ouvir. Verdade se acrescente que a conversa me interessou por nunca antes ter, antes, pensado no assunto. As referidas senhoras regressavam de um funeral e a conversa que mantinham versava a curiosidade manifesta de assistirem a tantos funerais e nunca terem visto o funeral de um chinês. As hipóteses que colocavam para o sucessivo raiava o surrealista e o mirabolante… se uma aventava que os congelavam e devolviam à procedência, outra sugeria (tinha-lhe dito o neto bem informado) que os embalsamavam e sentavam na sala frente ao televisor. A terceira, bem quanto a essa, abstenho-me de relatar aqui, aquilo que apontava como procedimento seguro dos descendentes em relação ao falecido.

Para concluir, não creio que esta conversa tivesse motivações xenófobas – aquela desconfiança, aquele temor pelo que é incomum e vem do exterior – que invariavelmente descambam em racismo. Acho que era mais curiosidade mórbida do que outra coisa… tal como a minha.

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