"Faço-lhe notar que um ser humano que não sonha é como um corpo que não transpira: armazena uma porção de toxinas"
Truman Capote

4.03.2010

Desalinhado



You may say that I'm a dreamer
But I'm not the only one
I hope someday you'll join us
And the world will live as one
“Imagine”
Lennon, John


Com inúmeras provas dadas e imenso prestígio acumulado, com enorme capital de credibilidade e elevada dose de voluntarismo, eis que surge na disputa presidencial que se aproxima, um outsider.

Idealista e homem de causas, oferece o peito às balas e dispõe-se a ser triturado pelas máquinas partidárias à esquerda e à direita, pelos interesses estabelecidos da partidocracia e principalmente pela indiferença congénita do cidadão comum, relativamente ao que se passa à margem do alarido e dos holofotes.

Sem agenda política oculta ou apoios explícitos, entrou em cena com a mesma devoção e desapego que emprega nos teatros de guerra e catástrofe onde a AMI tem marcado presença assídua.

Apesar de todo o cepticismo que o sistema político-partidário em que vivemos me induz, vejo aqui uma oportunidade de redenção e confirmação.

Um pretexto para (voltar) a acreditar que é possível “meter pauzinhos na engrenagem”, pese embora a convicção que a engrenagem trucidará inapelavelmente esses “pauzinhos” perante o alheamento crónico dos nossos concidadãos.

Não lhe regatearei o meu voto como outros não lhe sonegarão o insulto e insinuarão a suspeita de ânsia de protagonismo e projecção mediática.

Certamente que este homem sonhou e continua a sonhar, como Luther King e outros mais, mas como é sabido os sonhadores não são deste mundo e muito menos da política. Incomodam, não se conformam e como tal devem ser marginalizados, ostracizados.

Fernando Nobre tem o futuro traçado!

Saudado seja pela coragem de o enfrentar.

3.21.2010

Poesia, poetas, poemas, poética...


Hoje é um dia especial... comemora-se o Dia Mundial da Poesia...
O mesmo é dizer, que se celebram os poetas, os tais que, nas sábias palavras de Maria Gabriela Llansol "vêm e anunciam a geografia imaterial por vir".

3.14.2010

Uma releitura de Shakespeare


(…)
Essa é a maravilhosa tolice do mundo: quando as coisas não nos correm bem – muitas vezes por culpa dos nossos próprios excessos – atribuímos a culpa dos nossos desastres ao sol, à lua e às estrelas, como se fôssemos celerados por necessidade, tolos por compulsão celeste, velhacos, ladrões e traidores pelo predomínio das esferas; bêbedos, mentirosos e adúlteros, pela obediência forçada a influências planetárias, sendo toda a nossa ruindade atribuída a influência divina... Óptima escapatória para o homem, esse mestre da devassidão, responsabilizar as estrelas pela sua natureza de bode.
(…)
"Rei Lear" William Shakespeare

3.07.2010

Desenhos Negros

Absolutamente a não perder, a retrospectiva de Robert Longo em exposição no Museu Colecção Berardo até 25 de Abril.

Maioritariamente constituída por desenhos a carvão em grande formato, inclui também escultura e pintura (esta integrada naquilo que Longo designa por Combines, onde mistura desenho, pintura e escultura).

Esta reunião de trabalhos “devolve-nos” a no desenho, no saber fazer que alguma “contemporaneidade” mais radicalizada foi subtraindo a esta disciplina, ao ponto de quase se considerar vexatóriamente académico (terrível epíteto este) um desenho figurativo, próximo do objecto que lhe serviu de modelo.

Longo sabe o que faz, e aquilo que faz é bem feito. O seu desenho é superiormente desenhado. Os trabalhos mostrados fazem parte de séries desenvolvidas com recurso a motivos recorrentes: vagas, explosões, tubarões, não deixando de fora a representação de rostos nos quais transparece uma grande serenidade não obstante a densa e inquietante penumbra que os envolve.

Presente também nesta exposição – e bem representada - a celebrada série “Men in the Cities”, da qual e um pouco ineplicávelmente um dos desenhos corre o risco de passar despercebido, dada a sua localização no átrio do Piso 0 em sítio pouco evidente.

2.28.2010

Um novo (já velho) flagelo

A Trilogia do Lixo - 3



É impossível falar de lixo sem falar de plástico, até porque, grande parte deste lixo não é bio-degradável.

O plástico (designação lata onde “cabe” um sem-número de matérias diferentes e diversas) é na actualidade, o equivalente às pragas bíblicas. A forma como invadiu as nossas vidas é massiva, contundente e aparentemente inelutável e irreversível.

Se olharmos em volta, verificamos isso mesmo, estejamos onde estivermos, estamos cercados de plásticos! Inclusivamente, em aparelhos vitais para a nossa subsistência e sobrevivência o que é ainda mais dramático, não havendo a este nível muito que se possa fazer para além de tomar posição, erguer a voz, protestar e fazer passar a mensagem no sentido de alertar consciências e tentar – tentar sempre – que uma tomada de consciência colectiva possa fazer inflectir o sentido em que vai avançando a “máquina produtiva”, pressionando a utilização de substancias bio-degradáveis, sem custos para o ambiente.

Podemos assobiar e olhar para o lado como se não fosse nada connosco. Podemos argumentar que temos mais em que pensar e mais com que nos preocuparmos para além desta coisa do ambiente, esquecendo que o ambiente, também somos nós e o nosso comportamento, podendo este ser melhor ou pior, por isso mesmo.

É confortável e alivia a consciência pensar que a responsabilidade cabe aos governos e às instituições e que nós pouco podemos fazer. Para além de ser um conforto pequeno, é também uma grande mentira! Podemos e devemos fazer qualquer coisa, basta querer. Para querer, não é preciso tomar nem atitudes radicais nem fundamentalistas, as nossas atitudes podem ser pequenas mas formativas e pedagógicas.

Neste âmbito, reduzir, reutilizar e reciclar, são as palavras-chave.

Existem algumas superfícies comerciais que instituíram os sacos de compras pagos, sejam eles reutilizáveis ou não. Este pormenor reduziu substancialmente a utilização de sacos de plástico. Já são muitas as pessoas que quando vão às compras levam o seu próprio saco anteriormente adquirido. É assim no “Pingo-Doce”, e é assim no “Mini-Preço” e no “Lidle”, para só citar alguns exemplos de uma atitude louvável.
Como louvável é a atitude dos responsáveis das livrarias "Trama" e "Letra Livre" que não usam sacos de plástico.

Mas há mais que se possa fazer, como seja o recusar – dizendo porquê - sacos inúteis, seja porque já transportamos um saco reutilizável, seja pela sua precaridade qualitativa ou dimensional que nos façam prever que não vai servir para nada. Exemplos? Os sacos pequenos das farmácias, os sacos pequenos da Fnac, entre muitos outros.

Se aceitarmos sacos por não ter como recusar, devemos proceder à sua utilização sucessiva até esgotar as suas possibilidades…

Algo a que é difícil escapar é a proliferação de copos de plástico em bares, cafés e nas máquinas automáticas que pululam um pouco por tudo o que é empresa, escola ou instituição, acompanhadas dos inevitáveis copos e colheres de plástico. Há que pressionar para que seja procurada outra solução para os recipientes que estas máquinas usam.

No caso particular dos espaços de diversão nocturna é compreensível que não haja condições para fornecer recipientes de louça ou vidro e depois proceder à sua recolha e lavagem para reutilização, mas é possível fazer campanha para que um mesmo cliente reutilize o copo onde bebeu a cerveja anterior, se for cerveja o que vai continuar a beber… Quem passar no Bairro Alto a um sábado ou domingo de manhã, poderá aferir aquilo que é dito.

O que já não é compreensível é um espaço que se quer tão sofisticado como a loja Delta do Saldanha, onde tudo é estilizado e fardado a rigor, sirva os cafés (caros) em louça de designer, acompanhada de colheres descartáveis… É degradante, sem ser degradável.

O que aqui se refere, não é publicidade. Os bons e os maus exemplos, devem ser nomeados. Os bons comportamentos devem ser enaltecidos e os maus apontados. Perante eles, cada um agirá segundo a sua consciência.

Todos os cataclismos naturais que se vêm sucedendo, repentinos e atípicos têm a sua origem nas agressões constantes de o planeta é vítima. As recentes enxurradas na Madeira, como as cheias no México, os incêndios na Grécia ou o degelo da Antárctida não são naturais. Essas coisas acontecem motivadas por um comportamento agressivo e desprovido de razão no que toca ao ambiente e ao território.

Toda esta retórica soa como “pregar no deserto” mas se a nossa atitude não mudar, muito mais estará para acontecer ao nível das condições climatéricas e não será seguramente melhor.

2.21.2010

O necessário e o supérfluo

A Trilogia do Lixo - 2



Nas sociedades desenvolvidas, o chamado crescimento económico, anda de braço dado com a produção. Quanto mais rico e desenvolvido for o país, mais elevado é o consumo per-capita. Esse indicador que atesta o desenvolvimento do país e a riqueza deste e por extensão, dos seus cidadãos, não diferencia o necessário do supérfluo.

Em tempos de crise, o consumo retrai-se, os orçamentos encolhem-se, os gastos diminuem. Nessas alturas, racionalizam-se um pouco as compras, diminuindo a aquisição de bens supérfluos em prol dos necessários à subsistência.

Nessas situações, dependendo da duração e profundidade da crise, as empresas diminuem a produção, despedem trabalhadores, encerram as portas.
As bolsas entram em colapso, a economia em depressão, os países em estagnação, as pessoas em aflição.

As crises não são eternas e as depressões, estagnações e aflições, também não.

A seguir a uma crise económica, segue-se um período de euforia e prosperidade, até que nova crise sobrevenha e o ciclo se repita.

Ninguém aprendeu nada, nem tirou lições para o futuro. A produção de bens de consumo volta subir, o consumo desses bens dispara para níveis elevados. O crescimento e o consumo voltam a crescer e toda a gente fica feliz e contente.

O homem é o único animal que consome para além do necessário. Se este problema – porque efectivamente se trata de um problema – não é de agora, nunca como nos dias de hoje existiu a tendência para confundir tanto consumo com felicidade.

Nestas alturas ainda mais do que em outras o consumo do desnecessário dispara à custa de necessidades inventadas e de produtos criados à sombra dessa invenção. Objectos ainda capazes de ser utilizados e de cumprir a função para que foram criados, são substituídos por outros mais capazes ainda, portadores de muitas outras funções que provavelmente nunca iremos utilizar, mas que nos dá satisfação possuir.

Os “obsoletos” vão inexoravelmente para o lixo, seja ele reciclável ou não, atulhando o planeta de toda a sorte de detritos, com as consequências ambientais que ostensiva e deliberadamente ignoramos, porque temos a doentia propensão para só atender ao imediato, desleixando o saudável hábito da prevenção.

Nesta como noutras questões, atribuímos as responsabilidades a governos e instituições, sem querer saber que as responsabilidades individuais também contam e as atitudes pessoais também importam.

Aparentemente o pior desta crise já passou. Os celebrados indicadores parecem apontar para uma nova era de crescimento e consumo, que o mesmo é dizer, novos produtos, novos objectos capazes de nos tirarem o sono até que os possamos adquirir e, claro está, de um aumento de objectos deitados no lixo, aumentando a área desmesurada que este já ocupa na terra, no mar e no ar.

Que se lixe o lixo, vamos celebrar… venha mais felicidade!

1.29.2010

Tanto Lixo é um Luxo

A Trilogia do Lixo - 1


A sociedade da abundância em que supostamente vivemos, caracteriza-se entre outras coisas pelo excesso de produção, o que levanta questões com tanto de insólito quanto de contraditório, como seja o incessante crescimento da pobreza.

Mas na nossa sociedade evoluída e civilizada, não é só a pobreza que cresce. O lixo é outro dos flagelos que o “desenvolvimento” transporta consigo. Se estendermos à ideia genérica de lixo, todo o desperdício que é gerado pelo consumo, teremos um retrato muito mais fiel deste modelo de sociedade.

Nos nossos dias, o lixo e o desperdício, tendem a crescer de forma exponencial e descontrolada, de acordo com o modelo de desenvolvimento ocidental e concorrencial, ao qual as preocupações ambientais – ideia recente e sujeita também ela às oscilações da moda e às leis de mercado – não conseguem obstar de forma decisiva e consequente.

Estudos divulgados em 2009 que se reportam ao ano de 2007, apontam que cada europeu produziu nesse ano e em média 522Kg de lixo. O português, um pouco abaixo, produziu “apenas” 472Kg. De todo o lixo produzido, apenas 22% foi reciclado permanecendo o restante em lixeiras e aterros. Grande parte deste lixo, não é bio-degradável, sendo uma elevada percentagem dele constituído por plásticos. Estes dados referem-se apenas aos países da União Europeia, sobre o resto do mundo pouco se sabe.

Esporadicamente têm surgido na imprensa, em recônditos artigos e micro-crónicas consentâneos com a importância do assunto, referências acerca da existência de uma imensa “ilha de plástico” que algumas fontes garantem ter uma dimensão duas vezes superior à dos Estados Unidos. A dita “ilha” constituída por 100 milhões de toneladas de plástico não bio-degradável, não para de crescer. Esta imensidão de plástico flutuante situa-se no Oceano Pacífico entre o Japão e o Havai e mantém-se aí por força dos ventos e correntes marítimas dominantes. O “monstro” é conhecido desde 1997, mas até agora nada foi feito para inverter a aterradora tendência aumentativa da “criatura”.

Esta aglomeração de resíduos terá sido originada em 1/5 pelas repetidas descargas de navios e de plataformas petrolíferas, vindo a restante percentagem do continente. A “Sopa de Plástico” como lhe chamam foi já responsável pela morte de mais de um milhão de aves e de cem mil mamíferos marinhos, sem contabilizar as mortes indirectas pela integração do plástico na cadeia alimentar. No entanto, este “fenómeno” permanece esquecido, arrumado e muito pouco conhecido e quase nada comentado. Porquê?

Talvez porque se localize em águas internacionais de difícil acesso e pouco tráfego e principalmente porque o tratamento de tamanha imensidão tem custos e nenhum país estará interessado num investimento dessa envergadura sem quaisquer contrapartidas económicas.

Verdade apregoada e muito pouco escutada – os resultados práticos legitimam este pensar – diz-nos que se o consumo de plástico não for drasticamente reduzido o tamanho da ilha duplicará nos próximos dez anos (esta previsão reporta-se a 2007).

Uma das perguntas aterradoras que circula pela Blogosfera é o que acontecerá ao planeta quando os milhões que constituem a população chinesa por exemplo, se aproximar dos valores de produção de lixo do cidadão europeu ocidental e a todo o plástico de embalagem que todos os dias se produzem e se deitam fora.


Essa pergunta é pertinente, mas uma outra se impõe: Estará a época ficcionada em Wall-E ainda muito distante?

Obs.:

A “Sopa de Plástico” pode ser espreitada em:

http://tube.aeiou.pt/sopa-plastica-o-lixao-do-oceano-pacifico-fantastico-globo/

A “Sopa de Plástico” pode ser acompanhada em:

www.projectkaisei.org.